quarta-feira, 23 de abril de 2014

MADAME BOVARY


Como é bom ler uma história bem escrita! Como é bom ler descrições bem feitas de pessoas, situações e cenários! Visualizamos os personagens, viajamos no enredo, vivemos as situações e nos emocionamos com os acontecimentos. Como é bom ler frases como essa: "... a palavra é um laminador que distende sempre os sentimentos." (pág. 277). E percepções como essa: "... pois que ninguém pode jamais dar medida exata às próprias necessidades, concepções ou dores, já que a palavra humana é como caldeirão fendido em que batemos melodias para fazer dançar os ursos, quando antes quereríamos enternecer as estrelas." (pág. 226). Ler tudo isso nos enleva. E tudo isso podemos encontrar em Madame Bovary, escrito por Gustave Flaubert.

Ema (Emma, a depender da tradução) torna-se Madame Bovary ao se casar com Carlos (Charles, a depender da tradução). Carlos é um médico esforçado, trabalhador, mas limitado intelectualmente, de maneira que tinha seus paciente, mas não avançava na carreira. Além disso, ele tinha personalidade fraca, era pacato, alimentava hábitos provincianos e lhe faltava ambição. Ema, ao contrário, era uma mulher requintada, ambiciosa e tinha um espírito sonhador, alimentado, em grande parte, pela leitura de romances sentimentais. Em pouco tempo, ela começou a se sentir presa num casamento que achava entendiante e passou a buscar a felicidade em outros homens. 

Percebe-se que não é uma história muito inventiva, mas por ser bem contada e por trazer de permeio debates e percepções importantes, o livro nos marca desde as primeiras páginas, quando o autor começa falando da experiência estudantil de Carlos, e acompanhamos esse personagem com atenção para saber quando e como a tão famosa Madame Bovary do título vai aparecer na trama.

Por falar em personagens, não gostei de Carlos, achei-o muito "zé mané". Ema tampouco me impressionou. Achei-a muito sonhadora e meio afetada. Mas entendo a grande repercussão e fama que ela alcançou. Era uma mulher decidida, questionadora e corajosa, que não hesitava em fazer o que lhe desse na cabeça, algo pouco comum às mulheres de sua época, mesmo na França. O livro, que hoje não levantaria tanta polêmica, causou escândalo nesse país, quando de sua publicação (meados do século XIX), tendo Flaubert ido a julgamento, do qual saiu absolvido. A alegação era atentado à moral e aos bons costumes por tratar o adultério de maneira tão direta e aberta, bem como por criticar a Igreja Católica. 

De fato, como muitos escritores, Flaubert escreveu Madame Bovary com o claro propósito de causar polêmica e de chamar atenção para as ideias que tinha a respeito da burguesia, da literatura, da religião e das mulheres; mas o fez com muita inteligência, elegância e maturidade. Não é como alguns escritores medíocres que acham que o fato de levantar polêmica por si só é o suficiente para tonar o seu livro bom. Madame Bovary está bem além dessa polêmica vazia, por isso esse livro é bom de verdade. Quer dizer, ele é ótimo. 

Título: Madame Bovary
Tradução: Enrico Corvisieri
Editora: Nova Cultural
Ano: 2003

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