segunda-feira, 6 de agosto de 2012

SERTANEJO BÃO DEMAIS DA CONTA


Costumo brincar que não volto mais à roça onde meu pai nasceu e morou até a juventude porque lá hoje não tem mais graça, pois as casas já contam com energia elétrica acompanhada de todo o conforto e comodidade dela decorrentes, como luz, televisão, chuveiro quente. Bom mesmo era quando a luz provinha da lamparina, o único eletrônico por perto era um rádio a pilha e o banho era de rio, cuja água ficava gelada no inverno. Claro que pretendo voltar um dia à terra do meu pai, pois tenho parentes e amigos queridos no lugar, além de desejar saber como tudo ficou depois que a "modernidade" apareceu por lá

Mesmo não sabendo como atualmente está a vida na região, creio que a chegada da energia elétrica tenha influenciado de alguma maneira os hábitos locais. Provavelmente as pessoas não mais se reúnem na sala, iluminada pela luz vacilante de lamparina, com o fundo musical do rádio a pilha na mesa do canto, todos sentados nos seus tamboretes, para contar e ouvir "causos" (muitos verídicos, outros com a verdade aumentada, e até algumas mentirinhas) para o riso e reflexão dos presentes. Talvez hoje a televisão tenha tomado o lugar da lamparina, do rádio, dos contadores de "causo". Se ficou melhor ou pior, não sei; teria que conferir pessoalmente. De qualquer maneira, deixemos essa discussão para depois, porque esse não é o propósito da postagem.

Quero, com essa divagação, falar sobre o gênero musical típico do interior do centro-sul do Brasil, principalmente dos Estados de Goiás, Minas Gerais, São Paulo e região sul da Bahia: o denominado Sertanejo ou Caipira (termo que muitos gostam de usar para distingui-lo do sertanejo moderno). Mais do que isso, quero compartilhar a reflexão suscitada por André Barcinski, um crítico da Folha de São Paulo, sobre a diferença da música sertaneja antiga e atual. O artigo desse crítico surgiu  a partir da entrevista que ele participou com o grande músico sertanejo Renato Teixeira (quem desejar ler o artigo completo segue o link: http://andrebarcinski.blogfolha.uol.com.br/2012/06/04/mudou-a-musica-caipira-ou-mudaram-os-caipiras/).

Segundo Barcinski, Teixeira respondeu, quando lhe pediram para listar a diferença do sertanejo antigo e o atual, o seguinte: “A música caipira sempre foi a mesma. É uma música que espelha a vida do homem no campo, e a música não mente. O que mudou não foi a música, mas a vida no campo.” Refleti sobre a teoria do Renato Teixeira, bem como sobre o comentário e as indagações de Barcinski. E sabe...! O músico pode ter razão! Claro que não dá para discutir profundamente esse tema numa simples postagem de blog, nem a intenção aqui é essa, porém é uma análise que merece destaque.

De fato as letras das músicas sertanejas de hoje, com raras exceções, como Deus e eu no Sertão de Vitor e Léo, não falam mais do amor inocente (muito pelo contrário), da saudade da terra, das belezas do campo, das vida simples na roça, como falavam as canções de antigamente. De alguns anos para cá, com o exôdo rural (nos últimos anos caiu, eu sei) e a tecnologia chegando ao interior, o distanciamento entre o campo e a cidade diminuiu. Não existe mais aquele isolamento e aquela solidão (termo que Barcinski usou) que tanto inspiravam os compositores antigos.  Para saber se essa aproximação foi a principal responsável por essa mudança, é necessária uma investigação mais cuidadosa. Renato Teixeira indicou um caminho.

Apesar desse novo cenário ou exatamente por isso, ainda há espaço para resgatarmos as belíssimas canções caipiras antigas e lembrarmos os seus grandes representantes como: Renato Teixeira, Pena Branca e Xavantinho, Sérgio Reis, Tião Carreiro e Pardinho, Tonico e Tinoco, Almir Sater, Chitãozinho e Xororó (no começo da carreira), além de outros. Afinal, a beleza da poesia, das melodias, dos arranjos, resiste ao tempo. Sem falar que o belo som da viola e da harmonia típica dos duetos ainda dão sossego aos ouvidos e à alma, independentemente de se conhecer ou não a realidade da vida no campo.

Escolhi duas músicas para postar aqui: Poeira, interpretada por Sérgio Reis, e Cuitelinho, na voz de Pena Branca e Xavantinho. Recomendo ainda as seguintes canções: Tristeza do Jeca, Vide, vida marvada, Inhambu-xintã e o Xororó, Luar do Sertão, Eu, a viola e Deus,  Chalana, Disparada, Fogão de lenha, Saudade da minha terra.

Poeira - Sérgio Reis

Cuitelinho - Pena Branca e Xavantinho

6 comentários:

  1. Ainda temos no interior do Goiás(que eu já conheci com o meu trabalho de extensionista rural), lugares de roça de verdade, onde se toma banho de bica ou rio, onde se planta para comer, e dorme cedo pois não tem televisão. Mas vejo como é difícil a vida de quem vive em uma situação dessa, falta água para beber pois não tem motor para puxa água, não tem água para plantar, não tem como conservar os alimentos que irão comer e tudo perde mais rápido..... e outras coisas mais.É bom pra nós que vamos de passeio a este lugares, não é fácil depender da terra para viver e tirar dela sua subsistência em uma situação tão precária. Em relação a música caipira , é uma verdadeira inspiração, sem se falar da harmonia. Quase não ouço a música caipira, mas lembro da minha adolescência (ainda não era adventista), que ia para fazenda do meu tio e andava de cavalo e a noite ouvíamos a música caipira e os peões tocavam com seus violões. Inesquecível !!!

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  2. Entendo, Danielle. Creio que, para muitos, em muitos lugares, a vida sem energia elétrica seja mto difícil mesmo. Na região do meu pai, a situação não era tão difícil como a que descreveu. Eles não têm problema com água para plantar e beber. Mas quero deixar claro que não sou contra a luz na roça, certamente ela facilita a vida do homem do campo, principalmente em relação ao cuidado com as plantações. E todo mundo tem direito à conforto e comodidade como geladeira, banho quente, eletrônicos. Só lamento mesmo pela televisão, pq é pode um objeto de difícil controle, que traz influências negativas e afasta as pessoas. Mas fazer o q? Em casa, procuramos selecionar bem o programa e ligar a TV só depois dos meninos dormem.
    A música caipira tb fazia parte da minha infância e adolescência. Meu pai ouvia mto no carro. E tenho uma identificação especial por esse gênero musical pq a roça é um ambiente bem familiar para mim porque passava muitas férias lá, tanto pelo lado da minha mãe quanto pelo lado do meu pai.
    Obrigado por acompanhar e participar do meu blog. Seus comentários sempre contribuem bastante.
    Até logo!

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  3. Gosto muito de ler seu blog, sempre muito bem escrito, tenho até vergonha dos meus erros de português, mas gosto de deixar minha opinião. Concordo com vc em relação a televisão, ela sempre toma o nosso tempo e contribui pela falta de dialógo entre a família. Sempre procuro não deixar os meninos assistirem desenhos da Tv aberta, seleciona e prefiro que assistam desenhos bíblicos. Até mais!!

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  4. Obrigado, Danielle. Bom saber que está gostando. Procuro me esforçar para apresentar o melhor texto possível, mesmo falhando algumas vezes. Quanto a eventuais erros de português, não me lembro de nenhum que você tenha cometido, pelo menos, nenhum tão grave. E, mesmo que tenha errado em algum momento, não se preocupe; afinal, quem não erra? Ainda mais no português, que é um idioma bem complicado. Certamente, cometi alguns erros também.
    Sobre esse assunto, lembro que recentemente o William Bonner vacilou feio na grafia de uma palavra no Twitter, e olha que ele é jornalista e vive disso. Então, nós dois estamos perdoados.rs
    Espero que continue comentando sempre que tiver vontade.
    Até logo!

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  5. Olá Hermes.

    Primeiramente, parabéns pela postagem e pelo link da entrevista, que lerei com calma depois. Realmente é uma reflexão interessante aqui abordada, e creio que sim, houve a mudança no meio caipira com o avanço da tecnologia, e que não, a música caipira não mudou, concordo com o Renato Teixeira. Ainda bem que temos muitos tesouros a zelar ainda relacionada a esta temática, e muitas pessoas que não vão deixar com que esta beleza que você tão bem definiu, se acabe. Parabéns também pela seleção das músicas ao final do artigo, inclusive uma delas, Chitãozinho e Xororó, foi tema da nossa última postagem.

    Abraço!

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  6. Obrigado pelos elogios e por participar do meu blog. Não conhecia o seu, mas, como sou admirador da cultura caipira e a conheço relativamente bem, certamente vou acompanhar o seu blog. Parabenizo-o por sua iniciativa também.
    E, como você bem observou, ainda bem que temos muitas pessoas dedicadas à tarefa de dar vida longa à música caipira; você por exemplo. No meu caso, sempre que posso divulgo esse gênero musical entre amigos, além de ouvir e comentar com os meu filhos.
    Abraço

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